07 de junho de 2025

Cartilha inédita orienta mães e pais sobre efeitos das mudanças climáticas na saúde das crianças brasileiras

Imagem: Divulgação / Médicos pelo Clima

Com linguagem acessível, o material foi produzido pelo movimento Médicos pelo Clima, com revisão da Sociedade Brasileira de Pediatria; conteúdo mostra os impactos de fenômenos climáticos registrados em cada região do país na saúde infantil

Secas, enchentes, queimadas, ondas de calor. Eventos extremos, cada vez mais frequentes no Brasil, ameaçam diretamente a saúde das crianças. Segundo o  Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), cerca de 40 milhões de crianças e adolescentes brasileiros estão expostos a um ou mais risco climático. Para alertar sobre esse quadro e fortalecer o olhar para a saúde infantil nas discussões sobre clima, Médicos pelo Clima — primeiro movimento brasileiro a mobilizar a classe médica no enfrentamento à mudança climática e à poluição do ar, idealizado pelo Instituto Ar — lançou ontem (05/06) uma cartilha inédita voltada a cuidadores. A partir da realidade de cada região do Brasil, os capítulos abordam os impactos físicos e mentais na infância e apresentam orientações práticas de prevenção e cuidado.

A publicação, que teve revisão técnica da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e colaboração do pediatra infectologista Renato Kfouri, foi produzida por médicas e médicos com atuação regional e ampla experiência em pediatria e saúde pública. Para cada capítulo foi  selecionado um evento climático que tem sido frequente em cada uma das regiões do Brasil: inundações no Sul (Dra. Marilyn Urrutia); chuvas intensas e altas temperaturas no Sudeste (Dra. Evangelina da Motta Pacheco Alves de Araújo); ondas de calor no Centro-Oeste (Dra. Natasha Slhessarenko F. Barreto); secas prolongadas no Nordeste (Dra. Maria Enedina Claudino de Aquino Scuarcialup); e queimadas na Amazônia, na Região Norte (Dra. Raquel Baldaçara). 

“As mudanças climáticas afetam diretamente a saúde das crianças: comprometem a saúde respiratória, influenciam a nutrição pela privação de alimentos e impactam a segurança alimentar. Também favorecem a proliferação de mosquitos transmissores de doenças como febre amarela, dengue, chikungunya e outras arboviroses”, explica Dr. Renato. “Informar a população sobre formas de cuidado e prevenção é fundamental. A comunidade médica tem um papel central nesse processo — o médico ainda é a principal fonte de informação confiável e de qualidade para as famílias no que diz respeito à prevenção e ao controle de doenças”.

A cartilha está disponível para download gratuito no site institutoar.org.br/saude-e-clima-na-infancia. O conteúdo foi escrito em linguagem acessível, sem perder o rigor científico, e inclui ilustrações e um glossário com termos de saúde e clima. O objetivo é apoiar mães, pais e  cuidadores, além de facilitar o diálogo entre médicos e famílias. O material foi realizado pelo movimento Médicos pelo Clima, a partir do patrocínio da RD Saúde e do apoio da Fundação José Luiz Setúbal, com parceria da Sociedade Brasileira de Pediatria (SPB).

Segundo o presidente da SBP, Edson Liberal, “as mudanças climáticas já são uma realidade no cotidiano das crianças brasileiras, afetando diretamente sua saúde física e mental. Ao colaborar com essa cartilha, a SBP reforça seu compromisso com a promoção da saúde infantil em todos os contextos, inclusive diante dos desafios ambientais”. Para ele, é fundamental que mães, pais, cuidadores e profissionais de saúde estejam preparados para reconhecer e enfrentar esses impactos. “Essa publicação traduz com clareza científica e sensibilidade regional os riscos que enfrentamos e oferece orientações práticas que podem salvar vidas. Acreditamos que informar é uma das formas mais eficazes de proteger”, destaca. 

O risco para as crianças brasileiras

O Brasil é considerado um país de alto risco pelo Índice de Risco Climático das Crianças (Children’s Climate Risk Index), desenvolvido pelo UNICEF. O levantamento aponta que 24,8 milhões de meninos e meninas com menos de 18 anos estão expostos ao risco de poluição do ar e 13,6 milhões ao risco de ondas de calor. Essa vulnerabilidade se intensifica entre crianças pequenas, cujos sistemas imunológico e respiratório ainda estão em desenvolvimento. 

A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) estima que a poluição do ar esteja associada a 50% dos casos de pneumonia e a 44% dos casos de asma, resultando em cerca de 600 mil mortes de crianças por ano. Crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social estão especialmente vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas, além daquelas que vivem comunidades tradicionais ou possuem algum tipo de deficiência.

“As mudanças climáticas já estão alterando profundamente as condições de vida e saúde das crianças brasileiras. Cada região do país revela, de forma singular, os desafios e urgências desse cenário. Em todas essas realidades, a saúde infantil emerge como um termômetro da crise climática e um chamado à ação”, avalia na cartilha o pediatra Daniel Becker, embaixador do Médicos pelo Clima. “Cuidar das crianças é cuidar do mundo em que elas irão crescer — e que esse compromisso una profissionais de saúde, famílias, educadores e gestores em uma jornada guiada pela urgência, pela responsabilidade e pela esperança”. 

Médicos engajados na relação entre clima e saúde

Anteriormente chamado de Médicos pelo Ar Limpo, o movimento Médicos pelo Clima surgiu em 2020 com o objetivo de unir forças em defesa da saúde pública e do meio ambiente no Brasil. Naquele ano, mais de dez associações médicas e o Ministério Público Federal se uniram para garantir a implementação dos prazos do PROCONVE (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores), assegurando o início da fase P8 para veículos pesados. Essa medida previa reduzir em até 95% as emissões do poluente “material particulado”, preveniria 140 mil mortes nos próximos 30 anos e evitaria cerca de R$ 575 milhões em custos hospitalares do SUS. 

Desde então, promove a conscientização da sociedade, a defesa de políticas públicas e o engajamento médico para enfrentar a crise climática e proteger a saúde da população. Já alcançou mais de 15 mil profissionais de saúde e passou a integrar coalizões como a Clima, Crianças e Adolescentes, a Coalizão Global Clima e Saúde e o GT Saúde Única da Sociedade Brasileira de Pediatria.  

“Colocar a discussão do tema sobre mudanças climáticas e saúde infantil é fundamental entre todos os atores desse processo: gestores públicos, comunidade científica, médicos, sociedades médicas e, claro, a população. É preciso envolver todos na decisão sobre as melhores maneiras de controlarmos, evitarmos e mitigarmos os efeitos danosos que o clima tem causado à saúde de todos — especialmente das crianças”, conclui Dr. Renato Kfouri.

Sobre o Instituto Ar

O Instituto Ar é uma organização sem fins lucrativos fundada por médicos, acadêmicos e profissionais do mercado comprometidos com a causa ambiental. Com mais de 16 anos de atuação, consolidou-se como referência na conexão entre saúde, clima e qualidade do ar. Protege a saúde humana por meio do enfrentamento às mudanças climáticas e da poluição atmosférica, transformando conhecimento científico em ação, influenciando políticas públicas e mobilizando a sociedade por um ar e um clima mais saudáveis.

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