06 de junho de 2025

Censo 2022: dados reforçam estigmas e invisibilizam as pessoas com deficiência no país

Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir / Crédito da foto: Arthur Calasans

Carolina Ignarra traz uma análise sobre os impactos dos principais dados do Censo para as pessoas com deficiência

São Paulo, 04 de junho de 2025 – Os dados das pessoas com deficiência no Brasil, com base no Censo 2022, divulgados na última semana, trouxeram reflexões que reforçam o quanto ainda é preciso conhecer, com mais profundidade, as realidades das pessoas com deficiência no Brasil. Esta é a avaliação de Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir – consultoria pioneira com a missão de trazer dignidade para pessoas com deficiência por meio da empregabilidade – aponta os principais dados apresentados pelo Censo 2022 no recorte de pessoas com deficiência e faz uma análise sobre os impactos na inclusão da pessoa com deficiência, em especial no mercado de trabalho. São eles:

  • População estimada de pessoas com deficiência no Brasil: 14,4 milhões, o que representa 7,3% da população do país

De acordo com Carolina Ignarra, esse é o dado mais sensível que a pesquisa do IBGE traz. Em primeiro lugar, porque ele está muito abaixo da média mundial. A Organização Mundial da Saúde estima que 15% da população global, ou seja, mais de 1 bilhão de pessoas, vive com algum tipo de deficiência.  É coerente que o Brasil tenha metade da estimativa mundial?

Impactos: ainda que o IBGE reforce que não é possível comparar os dados das metodologias anteriores e que o método para coletar as informações de pessoas com deficiências nas entrevistas da pesquisa, vale lembrar que o penúltimo Censo, realizado em 2010, contabilizava 45 milhões de brasileiros com deficiência, ou seja, cerca de 25% da população na ocasião. Porém, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) feita pelo próprio IBGE em 2019, apontou outro dado: 17,3 milhões, que representavam 8,4% da população brasileira com idades acima dos dois anos têm algum tipo de deficiência, naquela ocasião.

Não parece coerente ter uma contagem inferior às próprias médias anteriores e às médias mundiais, principalmente com o aumento da violência no país e ainda por ter sido o Brasil um dos países que mais sofreu e vitimou pacientes na pandemia da COVID-19. É fato que avançamos em cultura e naturalização da condição de deficiência, apesar de ainda faltar muito, se nos declaramos mais nas empresas e nas escolas, por que nos declaramos menos no Censo?

“Ainda não há consenso no Brasil sobre o que é deficiência — e toda vez que reduzem nosso número, reduzem também nossas urgências, nossas demandas e nossa representatividade. Sem dimensionar corretamente essa população, é impossível desenhar políticas públicas eficazes para combater desigualdades e exclusão”, destaca Carolina Ignarra.

Quando invisibilizam as pessoas com deficiência, negligenciam nossos direitos, segundo Carolina Ignarra. Que reforça ainda que a Lei de Cotas é um exemplo disso. A cada ano, a lei que foi feita para aumentar a inclusão, diminuir as injustiças nas oportunidades de emprego, ao invés de ser atualizada, melhorada, sofre ataques para ser extinta.

Com dados cada vez menores da representatividade dessa população, há uma certa ‘desimportância’ por essa inclusão, deixando leis, que nos garantem cidadania, cada vez mais vulneráveis ou extintas. Se atualmente há pessoas com deficiência no mercado de trabalho, movimentando a economia do país, cada vez mais, é muito por conta da Lei de Cotas.

  • Escolaridade das pessoas com deficiência

O Censo mostra que em 2022, entre as pessoas de 15 anos ou mais de idade com deficiência, 2,9 milhões eram analfabetas. Isso corresponde a uma taxa de analfabetismo de 21,3%, ou quatro vezes a taxa de analfabetismo das pessoas sem deficiência (5,2%). No Brasil, 63,1% das pessoas de 25 anos ou mais com deficiência não tinham instrução ou não haviam completado o ensino fundamental. Entre as pessoas sem deficiência, essa proporção era quase a metade (32,3%). Em 2022, apenas 7,4% das pessoas com deficiência haviam concluído o ensino superior, contra 19,5% das pessoas sem deficiência.

Impactos: esse é o dado que mais reforça estereótipos negativos da pessoa com deficiência e que se agrava quando ela chega ao mercado de trabalho. Falta de qualificação tem sido o principal argumento para a exclusão na seleção de emprego. Porém, vale lembrar que a falta de acessibilidade em escolas, metodologias de ensino e por falta de educadores preparados para ensinar pessoas com deficiência são barreiras que impedem o desenvolvimento social e cultural dessa população. Ainda assim, as estatísticas são controversas.

Uma pesquisa realizada a partir do banco de dados pela Talento Incluir, com dados de 566 pessoas com deficiência em busca de emprego, trouxe um recorte muito interessante: profissionais com deficiência estão buscando qualificação. O estudo revelou que 49,8% dos participantes possuíam ensino superior completo, destes 24% teriam qualificações avançadas, como pós-graduação, MBA, mestrado ou doutorado.

Mas, o principal impacto neste tema é, ainda que qualificadas, as pessoas com deficiência passam anos nas mesmas funções.

A pesquisa “Radar da Inclusão: mapeando a empregabilidade de Pessoas com Deficiência”realizada em parceria da Talento Incluir, Instituto Locomotiva, Pacto Global e a iO Diversidade, revelou que a falta de oportunidade para as pessoas com deficiência ou neurodivergentes no mercado de trabalho se reflete na hierarquia das empresas. A maioria das pessoas com deficiência empregadas que responderam à pesquisa (84%) não ocupam cargos de liderança. O levantamento mostra também que, embora metade das pessoas com deficiência ou neurodivergentes empregadas tenham mais de três anos de empresa, 63% nunca receberam uma promoção, 19% receberam apenas uma promoção e 18% receberam duas promoções ou mais.


O que justifica essa falta de desenvolvimento nas carreiras das pessoas com deficiência com estudo e qualificação, senão a atitude capacitista? O capacitismo resume a pessoa com deficiência a uma só condição. Ele congela a deficiência e raramente se estende para nossas interseccionalidades.

  • A mulher é maioria entre pessoas com deficiência

Segundo os dados divulgados, o Brasil soma 8,3 milhões de mulheres com deficiência e 6,1 milhões homens com deficiência.

Impactos: a mulher está mais exposta às deficiências, principalmente em um país como o Brasil que atinge todos os anos números recorde de violência contra a mulher. Mas, infelizmente, ainda que seja maioria, isso não se reflete em ações de melhorias de qualidade de vida e bem-estar da mulher com deficiência. A saúde não é acessível e o mercado de trabalho ainda invisibiliza a feminilidade da pessoa com deficiência, como se ela fosse um ser humano assexuado. No geral, elas sofrem com a violência obstétrica, a falta de direitos de maternidade, rede de apoio estruturada, dentro e fora do ambiente corporativo, entre outras questões.

  • Contagem da população com deficiência por região do País

De acordo com o Censo, em 16,0% dos domicílios recenseados, havia pelo menos um morador com deficiência. O Nordeste apresentou o maior percentual (19,5%), seguido por Norte (17,8%), Sudeste (14,7%), Centro-Oeste (14,3%) e Sul (14,1%).

Impactos: ainda que o ranking de regiões esteja contabilizado, não se pode garantir que os respondentes tenham entendimento sobre o que de fato é deficiência. Por isso, a falta de uma apuração mais aprofundada, pode levar a uma concentração errada de recursos e realização de projetos para atender essa população em que não estejam alinhados com a real demanda local.

  • Transtorno do Espectro Autista (TEA)

A novidade do Censo 2022 foi a divulgação das Pessoas com Deficiência e Pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Os resultados preliminares da amostra trazem os perfis sociodemográfico e educacional das pessoas de 2 anos ou mais de idade com deficiência e das pessoas diagnosticadas por profissional de saúde com transtorno do espectro autista (TEA).

Impactos: ainda que seja muito importante trazer luz a esse tema, vale lembrar que toda deficiência importa. O TEA deve ser uma porta de entrada para que todas as outras deficiências recebam atenção e respeito da sociedade. Estamos assistindo com muita alegria o crescimento desse tema em espaços importantes, porém é preciso lembrar que a acessibilidade e o respeito às diferenças é um direito também das demais pessoas com qualquer outra deficiência. Quando há acessibilidade, há possibilidades e respeito às pessoas com Transtorno do Espectro Autista, às pessoas com deficiências físicas, às pessoas com baixa mobilidade temporária ou permanente, às gestantes, às crianças de colo e tantas outras pessoas que se beneficiam de meios que as possibilitem desfrutar de experiências e conhecimentos acessadas pelas pessoas sem deficiência.

“A realidade é que enquanto não houver entendimento sobre que é deficiência continuaremos sendo dados inexpressivos de um país. Infelizmente, temos um estudo que não engaja decisores, não promove nossas demandas, nos invisibiliza e não nos representa. Isso só faz aumentar nossa missão de atuar no letramento da inclusão, que é – antes de tudo – trabalhar para colaborar com o aperfeiçoamento da humanidade de cada indivíduo, de cada empresa, de cada nação”, conclui Carolina Ignarra

Sobre a Talento Incluir

A Talento Incluir, empresa com atuação pioneira em Consultoria, Letramento, Empregabilidade e Capacitação das pessoas com deficiência, já inseriu no mercado de trabalho mais de 9 mil profissionais com deficiência. Fundada em 2008, sua missão é trazer dignidade para pessoas com deficiência por meio da empregabilidade. Em toda a sua trajetória, aplicou Programas de Inclusão 360º para formar e fortalecer a cultura de inclusão em mais de 650 empresas de diversos setores em todo Brasil, como Mercado Livre, Renner, Mondelez, Siemens Energy, Siemens Healthineers, Organizações Globo, Sephora, Loreal, AstraZeneca, GRU Airport, Eurofarma entre outras. Para mais informações, acesse: Talento Incluir (site)

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