Artur Faria, CEO da Oxygea / Foto: Divulgação
As startups seguem enfrentando uma série de desafios desde 2020. Nos últimos anos, as incertezas nos negócios impediram o crescimento de muitas delas, mas quem conseguiu superar esse ‘inverno’ prolongado, está otimista para 2024 e aponta tendências para diversos setores.
Um levantamento da Latitud, plataforma de empreendedorismo e fundo de investimentos focado em aportes do nível pré-seed, aponta que 89,9% dos fundadores e investidores preveem que o ano será positivo. Além disso, 56% dos empresários têm expectativa de crescimento superior a 10%, segundo a pesquisa Panorama 2024, realizada pela Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil).
Aportes e investimentos
Começando pelos investimentos, a tendência é que os fundos sigam mais seletivos. Um estudo da KPMG aponta que 60% das captações em 2023 aconteceram em rodadas iniciais de investimento (pré-seed ou seed). De acordo com Artur Faria, CEO da Oxygea – veículo de CVC, CVB e aceleração de startups que irá investir US$150 milhões com foco em sustentabilidade e inovação nos próximos 5 anos, “o que temos notado é uma seletividade maior dos fundos, em especial em Series A e B que se traduz no aumento do tempo médio para concretização dos deals, fruto de diligências, agora, mais abrangentes e consequentemente em uma redução do número de deals. Outra tendência que continuaremos a ver é a priorização do portfólio atual, fundos estão mais simpatizantes a primeiro reforçar o caixa de boas empresas de portfólio para realizar novos investimentos.”
Para Richard Zeiger, sócio da MSW Capital, gestora de venture capital especializada em Corporate Venture Capital que investe em startups nos estágios iniciais, o mercado de energia será destaque no próximo ano. “À medida que nos aproximamos de 2024, vislumbramos um horizonte de oportunidades melhores para o cenário do Venture Capital. Em particular, o setor de energia (energytechs) emerge com forte potencial de crescimento por conta da transição energética que será impulsionada por inovações tecnológicas e uma crescente conscientização ambiental (fontes renováveis), criando um cenário propício para investimento de risco em novos modelos de negócios. Na MSW Capital estamos atentos a oportunidades inovadoras que promovam a sustentabilidade e a eficiência energética e antecipando esse movimento, em 2023 já realizamos investimentos em startups que estão 100% inseridas nesse contexto.”
Democratização da IA Generativa
2023 foi um ano de muita experimentação da IA Generativa e uma corrida dos grandes provedores como Microsoft, AWS, Google, em demonstrar a sua capacidade de aplicar inteligência artificial dentro do dia a dia das empresas.
Para Vinicius Gallafrio, CEO da MadeinWeb, provedora de TI, a inteligência artificial continuará em alta. “Eu acredito que em 2024 deva continuar essa onda de Inteligência Artificial e vamos ver isso aplicado mais à prática, chegando também à mão das pessoas e sendo usada em produção por várias empresas. Além disso, a parte de cloud computing, especialmente em cibersegurança, continuará crescendo em paralelo com a temática ESG com as empresas buscando o crescimento do seu negócio de forma sustentável. Para compensar essas operações mais eficientes que respeitam o meio ambiente compensando a emissão de carbono, será necessário investir cada vez mais em cibersegurança, uma vez que as empresas estão alocando seus dados em plataformas, usando inteligência artificial e cloud computing”, pontua.
Mercado de seguros mais otimista
Este cenário é visto com otimismo até mesmo para as empresas que têm crescido sem receber investimentos externos. No setor de seguros de viagem, por exemplo, a expectativa, de acordo com uma pesquisa da Associação Brasileira de Seguradoras (ABESE), é que o mercado cresça 36% em 2024. Para Raphael Swierczynski, sócio-fundador e CEO da Hero Seguros, insurtech disruptiva especializada no mercado digital de seguros, “essa é uma tendência que vem atrelada às mudanças de comportamento no pós pandemia. Com a retomada das viagens, o turismo tem vivenciado um crescimento expressivo, enquanto a conscientização sobre a importância do seguro viagem tem se tornado uma prioridade para os viajantes”, comenta.
A empresa viu seus negócios crescerem exponencialmente e, em menos de 1 ano e meio, alcançou a marca de R$12 milhões em prêmios emitidos no mês de julho, com mais de 90.000 bilhetes de seguros. “A expectativa é que em 2024 o crescimento do setor continue acelerado. Para se ter uma ideia, só em 2023 a procura por seguros-viagem no Brasil cresceu 230% em relação a 2022.”, conclui.
Consumo online de produtos rurais continua forte
O setor agrícola, extremamente importante para o país e responsável por impulsionar o PIB brasileiro, mostra que a mudança de comportamento do produtor rural no consumo online continuará aumentando no ano que vem. Para se ter uma ideia, de acordo com a pesquisa de Agricultura Digital no Brasil, feita pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), mais de 80% dos agricultores brasileiros já utilizam pelo menos uma tecnologia digital como ferramenta de apoio na produção agrícola. Dos produtores que participaram da pesquisa, 40% afirmaram que usam a internet como canal de compra e venda. “Analisando esses números, percebemos que a indústria do agro está cheia de possibilidades para se adaptar às novas tecnologias e tendências de mercado. E o consumo em plataformas digitais é algo que deve continuar crescendo fortemente em 2024 e nos próximos anos”, conta Ivan Moreno, CEO da Orbia, uma das únicas empresas do setor que oferece, de forma integrada, benefícios por meio de um programa de pontos e uma ferramenta de compra e venda de insumos agrícolas online para os agricultores.
Aumento do consumo por aluguel ou assinatura
CEO da allu, maior empresa de aluguel de Iphones da América Latina, Cadu Guerra percebe que, em 2024, a tendência de consumo deve seguir cada vez mais para a experiência, além da mudança do conceito de posse: “A melhor forma de crescer é entregar para as pessoas o que elas querem, de um jeito melhor, mais rápido, mais eficiente ou unindo vários desses pontos e construindo uma experiência única. Seu produto ou seu serviço sempre devem ser arquitetados pensando em entregar o que você sabe que o cliente deseja”, explica.
Cadu percebe, ainda, uma mudança geracional e necessidades de se vivenciar experiências mais completas, reais e acessíveis: “Em 2024, acredito que ficará ainda mais evidente a noção sobre economia circular. Não é necessário possuir um produto para, então, vivenciar a experiência que ele entrega. O universo das assinaturas traz acessibilidade e mais liberdade de escolhas”, finaliza.
Retomada de contratações em tecnologia
Apesar do mercado de tecnologia ter sido impactado consideravelmente com a onda de layoffs – iniciada especialmente no final do primeiro trimestre de 2022 e ainda em curso -, Sylvestre Mergulhão, fundador e CEO da Impulso, people tech que oferece serviços em todo o fluxo de atração, contratação, desenvolvimento e retenção de times de tecnologia remotos, está otimista. “Já temos indicadores que demonstram uma retomada de crescimento para 2024”, atenta, referindo-se à própria demanda do mercado, que é de uma média anual de 159 mil profissionais, segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais (Brasscom), e pelas tendências, incluindo as que tiveram destaque em 2023. “O setor de tecnologia segue aquecido, também em virtude da inteligência artificial, que exige habilidades como programação, análise de dados e gerenciamento de sistemas inteligentes”.
Digitalização de recebíveis de cartões
No setor de adquirência (“empresas de maquininha”), Cesare Rollo Iacovone, CEO da Destrava Aí, fintech que oferece infraestrutura de gestão de garantias especializada em recebíveis de cartões, atenta que o mercado espera por uma “transformação significativa” para todos os players devido à atualização das normas relativas à digitalização de recebíveis. “Além disso, veremos uma transformação radical na gestão do pricing dessas empresas, considerando os impactos da nova dinâmica das reservas financeiras e de antecipação automática, vigentes a partir de abril de 2024”, pontua.
O empreendedor acredita ainda que o mercado de capitais deve ajudar a trazer um “alívio” no caixa de empresas de todos os portes, via dívida privada. “Acredito que isso será possível considerando a expectativa de redução do custo local de captação, novos influxos de capital advindos da, agora possível, captação de FDICs no varejo e de melhorias institucionais, como o Marco das Garantias.”
IA no mercado de trabalho
O mercado de trabalho está prestes a sofrer um impacto significativo devido à ascensão da inteligência artificial. Para os profissionais, a ênfase recai na constante busca pela especialização em suas áreas, visto que a IA requer um conhecimento específico para seu aprimoramento. Além disso, há um potencial de empoderamento: a combinação entre humanos e IA promete simplificar tarefas e ampliar o impacto na sociedade. Na Zup, que desenvolve produtos cloud first para que empresas de todas as áreas possam ter sistemas seguros e escaláveis para promover o crescimento, encarar essa evolução não apenas como uma adaptação, mas como uma oportunidade para alcançar feitos notáveis, parece ser o caminho a seguir.
“Acredito que o mercado de trabalho vai ser muito impactado pela inteligência artificial. Diversas funções, especialmente nas áreas de atendimento ao cliente, vendas e desenvolvimento de software, podem ser substituídas por agentes e modelos automatizados. Para os profissionais, vejo que a principal recomendação será estudar e estar antenado para ser o especialista em sua área, já que a AI precisa de aprendizado contínuo que esse especialista pode prover. Ao mesmo tempo, vejo um momento de empoderamento com a inteligência artificial, tornando mais fácil e aumentando as possibilidades das pessoas causarem impacto na sociedade e no mundo. Ao abraçar a evolução tecnológica, os profissionais podem não apenas se adaptar às mudanças, mas também utilizar as ferramentas disponíveis para alcançar feitos extraordinários”, comenta Bruno Pierobon, CEO da Zup.
Criptomoedas no panorama financeiro de 2024
Em uma visão perspicaz sobre o mercado de criptomoedas em 2024, Marlyson Silva, CEO da Transfero, empresa que conecta os sistemas bancários, cripto e financeiro, a partir de soluções financeiras baseadas em tecnologia blockchain, destaca as duas principais tendências para o próximo ano.
A primeira delas diz respeito ao impacto das criptomoedas nos pagamentos cross border. Segundo o CEO, as criptomoedas revolucionaram o mercado de pagamentos internacionais (cross border payments) de várias maneiras em 2023 e a tendência é que se consolidem como uma ferramenta importante nesse segmento ao longo de 2024, por conta da redução de custos e tempo de transação; a segurança e transparência inerentes às transações de criptomoedas, registradas em blockchains e a promoção de inovações em produtos financeiros, abrangendo remessas, trade finance e hedging de riscos cambiais.
Apesar dos benefícios, a adoção em massa enfrenta desafios regulatórios e de aceitação, incluindo volatilidade do mercado, preocupações com lavagem de dinheiro e a necessidade de um quadro regulatório mais claro em diversas jurisdições. Nesse contexto, a segunda tendência é a importância das stablecoins na integração de pagamentos e serviços financeiros ganhará destaque em 2024. “As stablecoins são ideais para transações diárias e serviços financeiros previsíveis, mantendo seu valor de forma, relativamente, estável. Elas facilitam pagamentos internacionais, superando as limitações dos sistemas bancários tradicionais em termos de rapidez e custos. Em regiões com sistemas bancários limitados, as stablecoins oferecem uma alternativa acessível para uma variedade de serviços financeiros, desde poupança até empréstimos e seguros” conclui Marlyson Silva.