22 de novembro de 2024

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Da quebrada à ONU, Isa da Firmeza lidera coalizão em defesa de meninas e mulheres negras na tecnologia

Aos 24 anos, Isabela Gonçalves é líder Rise UP Brasil, que apoia mulheres em todo o mundo para influenciar a elaboração de políticas públicas que promovam a equidade de gênero e raça / Foto: Divulgação Rise UP Brasil

Nascida em 2000, Isabela Gonçalves já tinha 18 anos quando a internet chegou à sua comunidade em Campinas, no interior de São Paulo. Ali, na quebrada, Isa cresceu pulando corpo estendido no chão da rua de casa, enquanto caminhava até a escola de manhã. Passou por abuso e racismo, sempre amparada com carinho e criatividade dos pais, militantes na Pastoral Operária. “Carrego os princípios da minha quebrada em cada passo que dou”, afirma.

Hoje, Isa da Firmeza, como é conhecida, é líder Rise Up e atua pela inclusão de meninas e mulheres negras na tecnologia. Coordenadora do Firmeza Hub e ex-coordenadora do Minas em Tech, na Casa Hacker, e apoiadora de projetos como Instituto Marielle Franco, Criola ONG, Coalizão Negra por Direitos e Pacto pela Democracia, Isa tem sido convidada a contar sua história. Recentemente, palestrou em evento da ONU,o American Girls Can Code, dedicado à educação. Em junho esteve realizando reuniões de trabalho com o Ministério da Educação, Ministério das Indústrias, Ministério das Mulheres sobre o Projeto de Lei 840/2021, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Da quebrada

Filha do auxiliar de serviços gerais Aparecido e da cozinheira Elza, Isa relata que os pais foram buscar a própria alfabetização já adultos, com a família formada, após o nascimento de seus dois irmãos mais novos, Luís e Pedro, uma criança autista. Todos moravam em uma casa de 3 cômodos com outras 11 pessoas da família. No início da adolescência passou por um processo de abuso sexual e teve apoio incondicional da familia “Meu pai me levou até a Delegacia da Mulher e registrou o boletim de ocorrência. Ele nunca duvidou de mim”, lembra.

No ano seguinte ao abuso, Isa entrou para o grêmio da escola. Sua primeira experiência como liderança foi reunir-se com a secretária municipal de Educação para demandar ar condicionado nas salas e a grade completa de professores. O pedido foi atendido. Aos 15 anos, foi a única aluna da escola selecionada para um programa da Unicamp voltado ao Ensino Fundamental. Pela primeira vez, Isa entrava no campus como aluna, e não como paciente do hospital universitário. O programa consistia em apresentar a Unicamp aos alunos durante as férias escolares. “Foi uma virada de chave na minha vida porque descobri que eu poderia estar ali para aprender, assim como os playboys que eu conhecia dos lugares onde meu pai trabalhava, como o Tênis Clube e a Aliança Francesa”, conta.

Ainda na adolescência, Isa engajou-se no movimento secundarista de ocupação das escolas, contra a reforma do ensino médio. Isa escreveu sobre a ocupação em um artigo publicado em revista científica e, desde então, nunca mais parou de militar. Para além da educação, envolveu-se no movimento negro e na cultura do hip hop. Conseguiu um estágio em uma startup de eventos para a educação, produzindo e promovendo dezenas de feiras de ciências.

Firmeza Hub

A transformação de Isa em Isa da Firmeza começou de fato com sua aprovação no vestibular da Unicamp, para a faculdade de Midialogia, aos 18 anos, quando também fundou a Firmeza Hub. “A Firmeza é uma plataforma voltada para ativação de tecnologias criativas nas cenas urbanas de norte a sul do país”, explica. Investindo na Firmeza, Isa deixou a Unicamp e Campinas após um ano do curso e transferiu-se para a Universidade Federal da Bahia (UFBA). No ano seguinte, ganhou uma bolsa de estudos por mérito profissional na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e migrou para o Rio de Janeiro, capital fluminense, onde vive há 5 anos.

No Rio, mergulhou na economia criativa, no afroempreendedorismo, engajou-se no Pacto pela Democracia durante a pandemia, estudou violência política de gênero, atuou como produtora na campanha “Tem Gente com Fome”. Trabalhou no Instituto Marielle Franco, onde conheceu a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Foi aluna do curso de extensão em Cultura e Política na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Isa também produz congressos acadêmicos na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Foi por intermédio da reitora da UERJ, Gulnar Azevedo e Silva, que Isa recebeu o convite para participar do evento “Mais Meninas e Mulheres na Ciência: por uma agenda de equidade e interseccionalidade”, com a ministra de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos. Isa também falou em eventos como LatinoWare, American Girls Can Code e Favela.Lab. Em todas essas atividades, ela incorpora o advocacy como estratégia-chave para promover as mudanças que deseja ver.

Genialidade Feminina

O próximo passo de Isa da Firmeza é a formação de uma Coalizão pela Genialidade Feminina, uma iniciativa inédita que busca dar visibilidade às mulheres geradoras de conhecimento nos quatro cantos do Brasil. “A tecnologia deveria ser um direito universal mas, sobretudo, uma ferramenta de inclusão de meninas e mulheres periféricas no mundo da ciência, do conhecimento e da inovação”, defende. Isa quer reunir e apoiar mulheres ribeirinhas da Amazônia, sertanejas, caiçaras, meninas das favelas, das quebradas e territórios urbanos que atuem na chamada área STEAM, um acrônimo em inglês para Science, Technology, Engineering, Arts, Mathematics (Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática).

A Coalizão monitora políticas públicas voltadas para mulheres que estão na ponta da educação básica, como professoras e diretoras de escolas públicas. “A gente identifica o projeto de lei, pressiona os parlamentares, pede modificações no texto, faz a coisa andar”, diz. Exemplo da eficácia do trabalho de advocacy da Coalizão é a alteração do texto do PL 840/2021 a partir das sugestões encaminhadas por Isa.

“Quero estar na execução de políticas públicas, na mobilização da militância por causas, na ativação das pautas que me movem e me trouxeram até aqui”, afirma. Hoje, trabalha na Nave do Conhecimento da Penha, espaço público que oferece acesso à tecnologia, internet de qualidade e cultura gamer, garantindo que a tecnologia seja um direito social para comunidades vulneráveis. É atuante também no Movimento Feminino de Arquibancada, que combate o machismo, o racismo e o preconceito nos estádios.

Rise Up

Rise Up é um programa internacional de aceleração de lideranças que firma parceria com mulheres, meninas e aliados que estão transformando suas comunidades e países como parte de um movimento global por justiça e equidade. Desde 2009, essa poderosa rede de 800 líderes da Rise Up defendeu com sucesso mais de 185 leis e políticas novas e aprimoradas, impactando positivamente mais de 160 milhões de pessoas em todo o mundo, mostrando a eficácia do advocacy em larga escala. A Rise Up tem um rigoroso processo de inscrição para encontrar os líderes promissores que estão promovendo a equidade e a justiça de gênero. O programa enfatiza o advocacy como uma ferramenta essencial para capacitar esses líderes a promover mudanças locais sustentáveis.

Site https://www.casahacker.org/genialidadefeminina

Linkedin https://www.linkedin.com/in/firmezaproduca/ Instagram @isadafirmeza

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